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Boas Práticas na Intervenção com a Criança com Autismo na Natação Terapêutica

A cada dia percebemos mais crianças com TEA chegando em nossas piscinas para a prática da natação.

A nossa ideia é auxiliar no desenvolvimento de estratégias e atitudes construtivas para a criança, a família e professores de natação infantil em nosso país.

Para que o resultado possa ser satisfatório, o profissional deve estar preparado e levar em conta continuadamente as necessidades individuais da criança, além de trocar informações com a escola, família e equipe de profissionais. Avaliando o quadro periodicamente poderá estabelecer o melhor a oferecer nas aulas.

Celso Goyos nos diz que, o autismo “afeta aproximadamente uma em cada cinco famílias, e que cada caso pode ser o responsável pela desorganização e desestruturação do ambiente familiar.” As características próprias do comportamento, somadas à severidade do transtorno podem constituir estressores em potencial para familiares e/ou cuidadores.

No nosso entendimento, quanto melhor for a intervenção do professor, maior contribuição será trazida ao cenário que as famílias das pessoas com autismo vêm enfrentando, tornando a trajetória familiar menos exaustiva e dolorida.

Uma vez que as crianças ficam muito interessadas neste espaço, há como trazer para a aula com a criança muitas possibilidades psicomotoras e técnicas da natação e, somar a este cenário a atenção necessária aos objetivos específicos que as crianças com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA) assim como, para as crianças que apresentam sinais de alerta em risco para o TEA, demandam.

Na Natação Terapêutica a criança com TEA pode ter redução de seu estado de excitação, medo e/ou ansiedade e ainda, se a frequência à piscina for boa, os atendimentos da natação devem ajudar na diminuição do estado de irritabilidade e pode favorecer os ciclos de sono e alimentação. 

Com o passar do tempo a criança se apropria de algumas aprendizagens importantes para um melhor andamento das sessões e aí é hora de realizar aulas em dupla ou mesmo, em pequenos grupos.

Nosso enfoque contempla 06 domínios:

1)Da atenção e concentração e afetuosidade. A piscina nos convida a momentos prazerosos de interação e quase sempre de intensa motivação. É ótima opção de lazer e para fazer amigos, além de ser um meio precioso para a aprendizagem da natação e também, de terapia. A água da piscina quentinha e a adequada intervenção fornecerá possibilidades para a criança lidar com o estresse no dia a dia, melhorar sinal de alerta e atenção. Se sua criança vivenciar momentos de tranquilidade e relaxamento, vai aproveitar tudo com maior segurança.

2)Da sequência do aprendizado e motivação da criança prestigiando os jogos de música e imitação, constante convocação para atividade e jogo apropriado com brinquedos.

3)De psicomotricidade e estimulação sensorial. A natação em temperatura confortável ou aquecida também incentiva e pode melhorar condicionamento físico, equilíbrio, estimular e enriquecer aspectos sensoriais, também, o controle, a persistência motora e o planejamento motor. Nossa intervenção deve acontecer mediante uma abordagem sistemática e estruturada, no entanto, valorize a movimentação espontânea e construa situações de interação verdadeira com a criança.

4)De intensão comunicativa e qualidade da comunicação social na compreensão e uso de linguagem, e, também, toda a estimulação para melhoria da competência social, da compreensão da linguagem da criança no decorrer da aula na piscina.

5)De atenção a elementos das habilidades e contato social e das interações sociais. Busque as outras pessoas na piscina e estimule pequenos diálogos com sua criança pensando em adequar alguns comportamentos inerentes à habilidade social.

6)De objetivos técnicos da natação terapêutica e de segurança aquática. Consideramos importante a estimulação o quanto antes ao desenvolvimento do nado utilitário para que a criança sobreviva em piscina funda, melhorando sua condição de segurança e aproveitando melhor seus momentos de lazer em família.

Sempre que nos perguntam sobre como começar, sugerimos alguns tópicos para que você coloque sua atenção.  Nossa prática foi desenvolvida e vem sendo utilizada ao longo de 30 anos de atuação e pode servir de apoio e base para que suas aulas de natação infantil sejam bem proveitosas:

 Nome

Pergunte sempre qual o nome da criança para ela? E a chame pelo seu próprio nome no decorrer do atendimento (“Ah! Pedro, você quer esse brinquedo?” “Bom dia Pedro. Como vai você?”) Evite falar com a criança na 3ª pessoa do singular como se ela fosse outra pessoa ou como se você falasse de uma outra pessoa (“o Pedro quer?”). Diga o nome da criança sem associar ou fazer nenhum gesto e observe sua resposta. Para enfatizar apoio ou reforçar ainda mais a atividade associe gestos ou expressões à sua fala quando chama a criança, para chamar melhor sua atenção. Nunca desista dela. Modifique os estímulos em novas tentativas.

 Atipicidade no contato visual

Observe a expressividade e qualidade do olhar dela para você e para as outras pessoas. Invista em aumentar o tempo e a qualidade deste olhar. Observe como ela reage quando ela brinca de esconde-esconde com você. Reforce o comportamento esperado (“Que bom que você olhou para mim” “oi, muito bem, estou aqui para brincar com você na piscina”). Você achará facilmente a melhor forma de estimular a criança e reforçar positivamente quando ela olhar para você ou fizer algo legal na aula. Observe se seu interesse é maior nos objetos. Faça o interesse dela aumentar por você.

Competência comunicativa e processamento da linguagem 

É oralizada? Qual o meio de comunicação prioritário? Fala ou balbucios? Gestos? O que significa o som que emite? Expõe sua opinião? Observe se ela repete palavras inapropriadamente ou como se quisesse algo e para isso usasse a fala de alguém ou uma fala usada numa outra situação ou de outro momento (ecolalia). Conheça os déficits persistentes na sua comunicação social e na interação social em múltiplos contextos e tente avançar em cada situação. Observe como se dá a dificuldade para estabelecer uma conversa normal. Dê comandos simples e observe se executa. Passe então, pra comandos duplos (ex. dê este brinquedo azul pra ele e este outro vermelho pra a mamãe). Interprete o que a criança quer e devolva pra ela oralizando o que você entendeu (ex. “Ah! Você quer tirar a boia”)

Peça à criança que conte os objetos com você e depois pode ser a vez dela, em voz alta. Tente ensinar as cores e letras. Veja se atende comandos de venha cá com gestos ou sem gestos em paralelo.

Interesse compartilhado

Observe se há dificuldade em compartilhar brincadeiras imaginativas ou em fazer amigos. Há ausência de interesse por pares? Engaja-se em brincadeiras? Responde a convites pra brincar? Invista em brincadeiras de faz-de-conta. Invista na habilidade para o jogo. A criança insiste constantemente em mudar de atividade? Invista na alternância de turno nas brincadeiras (“Agora é a minha vez/E agora é a sua vez). Realiza brincadeiras solitárias? Tente se incluir. Evita ou ignora o contato com o outro? É interessado? Conquiste seu interesse mesmo que agora seja um interesse momentâneo. Normalmente o compartilhamento de interesses, emoções ou afeto são reduzidos. Invista na reciprocidade sócio emocional e na dificuldade para iniciar ou responder às interações sociais. Há ausência total de expressões faciais e comunicação não verbal? Valorize expressões e sorrisos quando compartilhados com você. Observe a criança em paralelo à presença de outras crianças. Aproxime-a em algumas situações. Observe se ela utiliza gestos ou palavras pra obter ajuda ou o que quer. Aponta pra objetos? Olha pra onde o professor aponta? Como se dá sua atenção (foco e sustentação)?

Interesses fixos

Demonstra reação de apego a um brinquedo? Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível às rotinas ou padrões ritualizados de comportamento?

(ex. sofrimento extremo em relação às pequenas mudanças, dificuldades com transições de uma atividade para outra, parece não ceder e seus padrões de pensamento são rígidos, observe se há rituais de saudação, necessidade de fazer o mesmo caminho ou ingerir os mesmos alimentos diariamente).

Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco? (ex. forte apego ou preocupação com objetos incomuns, interesses excessivamente circunscritos ou perseverativos). Observe sempre suas reações e ofereça novos caminhos.

Estímulos Sensoriais

Hiper ou hipo reatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente (p. ex., indiferença aparente a dor/temperatura, reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, fascinação visual por luzes ou movimento). Reage a dor? Sua sensibilidade sensorial é demasiada? Como reage? Há modulação? Parece mais participativo em atividades mais agitadas? Com muito barulho reage mal? Não tolera muita aproximação e toque do professor? Veja de que maneira responde melhor e se sente mais confortável. Uma criança num nível de incômodo alto não tenderá a participação e não deverá se engajar na atividade.

Estereotipias

Tem comportamentos repetitivos ou estereotipados? Quando aparecem?

Apresenta estereotipias motoras simples? Ou seus movimentos estereotipados e sem função comprometem a atividade? Movimenta partes do corpo repetidamente quando muito feliz? Prefere alinhar brinquedos do que brincar funcionalmente com eles? Gira objetos ou seu corpo? A ecolalia, ou uso de frases idiossincráticas pode ser um tipo de estereotipia. Dê significado ao movimento se possível. Chame sua atenção para outra atividade.

Gerais

A criança tem noção de perigo? Parece perceber os riscos na piscina? Vai constantemente ao fundo e não pede ajuda?

O que a deixa irritada ou mais ansiosa?

Há comorbidades associadas como hiperatividade, epilepsia ou cardiopatia?

Há variações importantes de humor, fadiga, funcionamento no decorrer do dia? Qual o horário ideal para a atividade?

Conheça rotina de medicação e se houve alterações que modifiquem comportamentos (sono, humor, agressividade, horários para xixi e cocô). Algumas crianças devido à troca ou aumento da medicação podem não mais conseguir avisar da hora que precisa ir ao banheiro.

Tem problemas de comportamento inadequado ou se auto-agride? Evite que possa machucar outra pessoa na piscina cuidando para que a atividade não exponha o risco, mesmo que para isso você tenha que usar seu corpo como barreira a impedir uma agressão. Utilize seu corpo para conter caso seja necessário evitar o perigo ou num momento de birra. Impeça agressões. Contenha comportamentos antissociais. Assim você evitará que outros se afastem da criança e facilitará as experiências de inclusão.

Conheça a rotina e como se dá seu dia-a-dia na escola.

Tem dificuldades de entendimento ou generalização. Invista na imitação ou quando pode usar crianças maiores em exemplos reais como modelo. Assim, as atividades podem ser mais compreensíveis por ela.

Criança dorme bem?

Tem baixa tolerância à frustração?

Como responde ao ser tocada? Como posso melhorar esta condição sem ser invasivo?

Para que a convocação seja percebida é sempre bem interessante tentar de vários modos e enriquecer os estímulos utilizados por você aos poucos. Tente sempre de um jeito diferente. E conversando com os familiares e professores da escola você certamente terá muitas pistas do caminho a seguir para melhorar empatia entre vocês.

Mantenha sempre um contato direto com a família e os outros profissionais que estejam com a criança. Converse sobre os objetivos comuns, sobre os avanços e retrocessos.

Estimule muitas vezes de várias maneiras diferentes. Chegue à condução de parte do corpo para a execução de um movimento esperado.

Conheça ou desenvolva ações que a tragam tranquilidade e que a acalmem em situações de ansiedade e raiva.

Recompense a criança com atitudes e reforços positivos orais ou associe a brincadeiras legais como “presentes” (saltos, brincadeiras ou brinquedos) que possam demonstrar que você está feliz pelo resultado alcançado imediatamente após o ocorrido.

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Não deixe de ver também http://www.sobrasa.org/crianca-com-deficiencia-segura-na-agua-recomendacao/

Por Marcia Ortiz

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